top of page

40 Horas de Arte – Nos versos do artista Lourenço de Bem


40 Horas de Arte é um projeto que reúne profissionais de artes visuais para refletir, incentivar e aguçar a crítica artística. O projeto que acontece há 22 anos no Atelier Lourenço de Bem se apresenta em duas configurações: produção de obras de arte e mesas redondas para discutir temas relacionados às artes plásticas.


"O 40 horas começou de um maneira muito informal, no meu atelier. As pessoas se encontram para dividir materiais, trocar técnicas e produzir arte. É um encontro de descobertas e novas possibilidades. Nele, o artista se sente um horizonte, se permite ampliar e fica mais vasto do que trabalhando sozinho. Neste ano estamos levando a discussão e as palestras para o Museu Nacional, pois o atelier já não suportava o público interessado”, resume Lourenço.

Para atender melhor o público, as mesas redondas do 40 Horas acontecerão no Auditório II do Museu Nacional de Brasília, em quatro finais de semana, aos sábados e domingos – local que contempla 85 assentos.


O 40 Horas – Seminário Internacional de Arte Contemporânea traz oito temas relacionados às artes com a participação de profissionais de renome e forte atuação no cenário das artes em Brasília, em outros estados brasileiros, na América Latina e Europa, a partir do dia 19 de maio. O cronograma completo e o espaço online para inscrições em breve serão divulgados.


Entre os convidados há artistas plásticos, curadores, galeristas, como Marília Panitz, Wagner Barja (Museu Nacional), Bené Fonteles, Irene Lasivita (Argentina), Eurípedes da Cruz (Museu do Insconsciente-RJ), Marcos Moraes (Itaú Cultural e FAAP) e Pedro Sangeon (Gurulino).


Lourenço de Bem concede entrevista para falar deste projeto que tem parceria com Renata Coli, produtora e assessora de comunicação do ateliê desde 2013; coordenação geral de Stella Lopes e Leo Góis e, como assistente de produção, Joana Piantino.


Leia a íntegra da entrevista:


Muito se fala do aspecto solitário do artista no sentido de trabalhar fechado e isolado em seu atelier e, porque não dizer, em si mesmo. O 40 Horas de Arte é um projeto que esquiva um pouco deste padrão, e não se pode dizer que foi uma experiência que não deu certo, afinal acontece há 22 anos, e o interesse do público-potencial cresce a cada nova edição. Como surgiu essa ideia?


O meu know-how sobre o trabalho de atelier é que o artista sempre esteve carente do ato de compartilhar seu processo criativo. Ou seja, o artista em seu habitat criativo não tem com quem dividir sua ideia e eu sempre ouvi reclamações sobre este estado muito individual, muito solitário, em que se extrai e depende somente dele.


O 40 Horas começou de uma maneira muito livre. Me lembro que as pessoas não tinham compromisso de pagar. Elas cozinhavam ali, dividiam suas refeições, se ajudavam, trocavam material. É um encontro de novas descobertas e novas possibilidades. As novidades que são trazidas nas 40 horas sempre foram muito enriquecedoras para cada artista. Ali você se sente um horizonte, você se permite ampliar, fica mais vasto do que trabalhando sozinho. No fundo no fundo, você vai voltar a trabalhar sozinho e isso também torna essa experiência única e especial, pois é um momento de criação e compartilhamento. Ali, você vai ter que exercitar pessoas bisbilhotando seu trabalho, seu processo criativo. O compartilhamento não é só de fora para quem cria, é de quem cria também para fora (para os outros).


Desde que começamos a fazer o 40 Horas, a ideia sempre foi a de compartilhar o processo criativo dos artistas. Foi muito interessante perceber o quanto isso é relevante para a vida artística, seja pelo incentivo, pelas trocas de técnicas, de observar o processo de cada um. Isso não foi um exercício fácil, pois todos sempre estiveram isolados em seus próprios ateliês sem ter com quem compartilhar conhecimentos, ideias, técnicas inovadoras.


O termo compartilhar encontra-se acentuado em sua fala enquanto se trata do projeto 40 Horas. Como acontece esse compartilhamento? E por quê?

O fato é que, todos nós temos dúvidas e quando a gente trabalha em grupo esse compartilhamento nos enriquece não somente no conteúdo técnico, mas no fazer, na prática. O artista antigo sempre reclamou dessa coisa de ter a responsabilidade da criação sem compartilhar. Quando ia mostrar seu trabalho, não se sabia o que poderia ser o resultado, a reação de quem observou sua obra.


Quando você tem esse trabalho compartilhado em grupo, num ambiente agradável, em que as pessoas se aproximam umas das outras, e têm vontade de questionar sem se apropriar, mas trocar, é muito mais rico. As pessoas constatam uma disparidade, pois são várias cabeças com ideias diferentes pensando a arte num mesmo lugar, porque vários olhares podem ver mais e melhor que só os meus olhos.


No entanto, não há que ter receios, porque esse compartilhamento não vai anular o filtro de cada artista. O encontro pode questionar, incentivar, aguçar a crítica; proporcionar o compartilhamento do processo criativo da pessoa, obviamente cada uma com seus filtros. E é um estimulo que o artista não vai encontrar sozinho dentro do seu atelier.


Então suas manias de trabalho sozinho acabam sendo expostas e você tem até como avaliar se elas seriam vícios de linguagem. Esse compartilhamento te dá margem para você sair da sua caixinha, ir além dos seus limites, você vai se incentivando a ver novas possibilidades e, se for o caso, no seu filtro, há coisas que vão passar e outras não vão passar. É um momento de exercício de humildade, de não guardar tudo para si e, ao mesmo tempo, de se abrir para algo novo.


O 40 Horas seria uma provocação, um desafio ao artista que cultiva o hábito de trabalhar sozinho em seu próprio atelier e contra o mito de que o processo criativo-artístico acontece quase somente num momento individual?


O artista enclausurado no atelier já passou. Não é mais um costume habitual dos tempos recentes. O compartilhar é mais contemporâneo, aliás.

Eu me lembro do tempo que convivi com artistas em geral, eu percebia que havia um certo medo de se mostrar, de mostrar o que se faz, como se faz...motivado um pouco pela concorrência.


Desde pequeno eu compartilho do atelier do meu pai. Que era dentro da minha casa e sempre vi essa ideia do artista solitário trabalhando em cima das suas características, do seu mundo fechado, e com dificuldade de compartilhar. E nesse processo, o artista acaba criando uma relação muito forte com suas manias e com seu material de trabalho, com sua espátula, com seu pincel. Ninguém quer que toque na sua espátula.


Convivendo com meu pai em seu atelier, que tinha seis filhos, imagina como era o atelier dele! Era o atelier mais invadido. Mas, ainda assim, me lembro que meu pai tinha uma espátula já antes de eu nascer e esteve com ele até morrer. É como um escritor que tem uma caneta com a qual ele escreve a vida inteira. Não sei se é essa a palavra, egrégora, mas estou falando da energia que há no atelier e em todos os materiais do artista. Então, baseado no mito de que as pessoas levam energia e roubam sua energia, o artista sente ciúmes e cria um excesso de proteção das suas coisas, que são intocáveis.


Eu convivi também com outros grandes artistas. Por exemplo, convivi com o Glauco Rodrigues, meu padrinho, em seu atelier durante um período que morei na casa dele, no Rio de Janeiro. Ele era uma pessoa com suas manias, com muito apego aos materiais, tinha um cuidado muito grande. Também convivi com o Scliar e era a mesma coisa: as pessoas chegam em seu atelier e querem ver como é, saber como ocorre a vida criativa do artista. É como ocorre com qualquer pessoa que não quer que mexa em suas gavetas, porque o que tem ali é significativo para ela e não para os outros.


Então assim, eu posso atestar essa realidade, de que o atelier do artista é superprotegido, intocável, como se tivesse muitos segredos, mistérios... e falo isso de um modo geral também... E para um artista abrir isso com outras pessoas, isso não fácil. Mas é a proposta das 40 Horas.


O 40 Horas no seu atelier fica totalmente aberto não somente aos artistas participantes, mas também aos visitantes que andam por toda parte, observam tudo (os materiais, as técnicas, o desenrolar do trabalho, etc.). Imagino que deve ser um exercício de entrega da sua parte, um desapego das coisas e inclusive das ideias que são só suas. Neste contexto, qual seria o objetivo do projeto em si e dos artistas participantes?


Em grupo, o artista vai ter que exercitar a doação do seu saber, das suas metodologias. Importa saber que ele (o artista) vai doar, mas vai receber muito mais. Imagina um espaço em que você doa o que sabe, mas aprende o que vários outros sabem; são vários artistas compartilhando saberes. É isso!

Então quando o artista volta para o atelier, ele volta enriquecido não só tecnicamente, mas como ser humano, como artista criador, praticando o exercício da humildade, de desfazer uma coisa que era só sua, transmitindo-a adiante.


Eu acredito que a contemporaneidade incentiva essa ideia de compartilhar e de adquirir um questionamento que você sozinho não vai obter.


Eu me lembro a primeira vez que fui trabalhar num shopping aberto: foi nas 90 Horas do Park Shopping. Era frio, mas eu transpirava com as perguntas que as crianças faziam para as mães e faziam para mim. Foi a primeira vez que fui trabalhar na rua... fazendo pintura ao vivo. Foi um parto, foi desconcertante. Mas digo que essa foi uma grande experiência em minha vida de artista plástico, e posso atestar que abriu uma porta importante para mim, eu me transformei, abri minha mente, pois a curiosidade alheia sobre meu trabalho me fez pensar sobre minha arte também.


Exemplo, eu gosto e levar meus alunos e grupos interessados em artes para conversar com o artista e perguntar particularidades sobre a vida dele. Nestas visitas aos atelieres, você vê o material que ele usa, não com intenção bisbilhoteira barata, mas atento, você vê o pincel, com que técnica ele trabalho, é uma visita extremamente enriquecedora. Então é muito interessante você abrir sua cabeça para isso. Me lembro agora do Milton Nascimento falando que o artista deve estar onde o povo está. É disso também que se trata.


Ao falar do 40 Horas, você também coloca o conceito de Arte Contemporânea. O projeto em si, que une artistas em um ambiente para produzir, refletir seus processos criativos e discutir a arte na atualidade, além de trocar ideias e experiências, é um movimento da Arte Contemporânea? Qual seria a relação entre o 40 Horas e a Arte Contemporânea?


A arte saiu do atelier, tomou a rua, e vou dizer mais, o artista que saiu do atelier é muito mais visível hoje em dia que o artista que não sai do atelier.... Você vê hoje a importância que tomou a intervenção urbana e como ela é uma ferramenta importante... outro dia, vi uma pessoa totalmente encantada com o painel que a pessoa fez na parede.


Dentre outras importâncias, vou destacar aqui que o artista hoje deve ter a capacidade de admitir ser visto, ser criticado, ser admirado, ser testado como criador, mas para isso é muito importante sair da sua zona de conforto onde ali ele manda em tudo. Se o artista hoje não for capaz de compartilhar sua arte, inclusive do seu processo criativo, ele não pode mais estar inserido esta arte atual que tem um cunho social, de interatividade, que abrange conhecimentos alheios e compartilha os conhecimentos que antes estavam atrelados somente a ele lá dentro do atelier.


Eu vejo na história da arte alguns artistas que iam pintar na rua, sobretudo artistas brasileiros – o Aldo Bonadei, o Pancetti, o Grinhard –, e aquilo era formidável. Mas o que é mais interessante é que até hoje, quando você (o artista) está num um ambiente ou na rua retratando o ambiente, ainda é um espetáculo.


Vimos nos últimos anos que o 40 Horas tem ganhado cada vez mais o respeito do público participante (formado por artistas plásticos veteranos ou estudantes), mas também de artistas de renome em Brasília e até fora do país. Também se nota que o formato do projeto tem sido modificado a cada nova edição? A que se deve essas mudanças?


Umas das funções das 40 horas, quando iniciou há 22 anos, foi essa coisa de provocar uma mudança na concepção deste espaço criativo. Mas ao longo do tempo, foi tomando características mais sérias. Começou obviamente não muito definido. Hoje é uma atividade criativa que muitos artistas que estão em crise, ou começando, ou mesmo em plena erupção criativa, procuram esse ambiente para ampliar e se situar dentro dessas novas características desses tempos que são muito multi, pluri, over.


Nós temos consciência da necessidade da discussão que essas 40 horas promovem de uma maneira sadia porque existe a necessidade de falar também, existe a necessidade de ouvir os colegas e existe a de ter horas de mão na massa e trabalho.


Neste ano, estamos levando a discussão e as palestras para o Museu Nacional. Porque lá no atelier, as pessoas acabam tendo que produzir muito durante o dia e à noite, no horário das palestras, estão exaustas, e mesmo exaustas elas ficam para não perder a discussão. Começamos as mesas redondas no 40 Horas em 2014 e já na primeira edição não se achava cadeiras suficientes para acomodar o público. Nas outras edições aumentamos o número de cadeiras e também não foi suficiente. Então para evitar esse cansaço extremo do artista, que é também ao mesmo tempo prazeroso, e para atender a demanda de interessados nas palestras, o 40 Horas deste ano se apresenta em duas versões: uma com foco principal na produção artística dentro do atelier com 22 artistas participantes e outra em forma de seminário internacional, que neste ano será no Museu Nacional, discutindo 8 temas relacionados à Arte Contemporânea com artistas do Brasil, da América Latina e Europa.


O que o 40 Horas do Atelier (com ênfase na produção de obras de arte) pode oferecer aos artistas participantes e/ou o público em geral?

Eu vejo artistas que estão dentro do seu processo há anos e se permitem tentar coisas novas, que topam a brincadeira e que, tenho certeza, que este projeto o ajudou em alguma coisa.


O que acontece é que às vezes, você (o artista) está tão engessado de uma coisa, sempre naquele mesmo espaço, nos mesmos moldes. E a ideia é que o ambiente do 40 Horas force a pessoa a respirar a coisa de uma forma diferente, e isso vai acabar influenciando nesse engessamento e, de alguma forma, ali mesmo naquele local, ou mais tarde, o artista vai acabar adquirindo um outro jogo de cintura para trabalhar.


É realmente interessante ver que a proposta das 40 Horas de Arte funciona, porque as pessoas que aceitam participar chegam ao atelier com muita vontade de trabalhar. E são 40 horas condensadas de criação. Quando você se dispõe a trabalhar 40 horas, eu li isso uma vez, o processo criativo concentrado permite ao artista um bum criativo que pode não acontecer para todos, talvez para um, dois ou três, mas quando acontece é algo realmente extraordinário.


Eu estava uma vez numa dessas experiências, por exemplo, e pude presenciar um caso de um artista que ficou ali dois dias enclausurado nele mesmo e no último dia ele teve o bum criativo dele. Foi uma catarse. Ele influenciou a todos. Enquanto a maioria começou pela primeira hora produzindo sem parar, ele só trabalhou após 35 horas, mas produziu mais e melhor que todos os demais que vinham tendo um procedimento regular cronológico no primeiro, segundo e terceiro dia. Nos primeiros dias, ele adquiriu, ele se alimentou, ele se questionou, questionou o trabalho dos outros, mas só teve um bum criativo imponente no último instante... É importante comentar o caso dele porque é bom que os artistas entendam que estamos proporcionando às vezes um momento de extrema angústia, de extrema novidade, e é isso que vai causar alguma coisa nova no processo criativo dele.


Na mesma linha, o que o 40 Horas Seminário pretende proporcionar aos artistas participantes e/ou o público em geral?


Dentro do que eu vinha falando desde o início, o seminário será o espaço para o debate sadio, para a discussão, para a reflexão da arte na contemporaneidade. Da mesma forma do 40 Horas de Arte no Atelier, o seminário também é um espaço de trocas. Só não inclui a ‘mão na massa’, mas a concepção das ideias, a apresentação verbal do que se tem feito em termos práticos, técnicos, intelectuais no campo das artes na atualidade, tudo isso estará em pauta. Se algo não estiver dentro de um tema, estará no outro, e se não couber neste ano, irá para os próximos, e assim por diante. A fonte de retóricas, pesquisas e descoberta na arte é inesgotável, afinal ela tem dentre seus predicados o comportamento de jamais deixar de evoluir. E, além disso, é a criação de um espaço que dá voz a importantes artistas e profissionais do mercado de arte para compartilhar ideias e informações com outros que também estão em busca deste mesmo espaço.



Serviços

Evento: 40 Horas – Seminário Internacional de Arte Contemporânea

Patrocínio: FAC

Idealização e Mediação das Mesas: Lourenço de Bem

Realização: Atelier Lourenço de Bem

Produção: Renata Coli, Stella Lopes e Curadoria

Assistente de produção: Joana Piantino

Local: Museu Nacional de Brasília

Datas: 19/05 e 20/5 | 30/06 e 1/07 | 29/09 e 30/09 | 10/11 e 11/11

Horário: 14h às 19h

Informações: celular (61) 993131-589 . wpp (61) 99161-8838 . fixo (61) 3546-6822

Inscrições e Cronograma completo: www.40horasdearte.com


Evento: 40 Horas – no Atelier Lourenço de Bem

Idealização e Curadoria: Lourenço de Bem

Realização: Atelier Lourenço de Bem

Produção: Renata Coli e Stella Lopes

Assistente de produção: Joana Piantino

Data: dias 8, 9 e 10 de Junho de 2018

Horário: 10h às 20h

Endereço: Endereço: SMLN MI 8, Conjunto 2, Casa 18-B. Lago Norte, Brasília-DF. Acesso pela pista (DF.005).

Inscrições Abertas: pelo celular (61) 993131-589 . wpp (61) 99161-8838 . fixo (61) 3546-6822

Posts Em Destaque
Posts Recentes
Arquivo
Procurar por tags
Nenhum tag.
Siga
  • Facebook Basic Square
  • Twitter Basic Square
  • Google+ Basic Square
bottom of page